3ª REAU -Rodada de Estudos Audiovisuais - de 22 de agosto a 29 de setembro
É com satisfação que, mesmo em meio à triste realidade que nos rodeia, chegamos à terceira edição de nossa modesta iniciativa de construção de mais um espaço de reflexão sobre o audiovisual. A REAU espera por dias melhores, mas sabe que a hora é de se guardar para quando o carnaval chegar (e, mais cedo ou mais tarde, ele há de voltar).
Originalmente pensada como uma série de encontros presenciais, a 3a rodada se adaptou ao tempo real e segue colocando sons e imagens em questão, mas agora de maneira exclusivamente online. Todas as atividades, sejam os cursos, mostras de filmes ou bate-papos, serão virtuais. Muda a plataforma, mas os módulos, os ministrantes-convidados, as mostras e sessões de cinema (entre curta e longas-metragens) seguem os mesmos.
As realizadoras Letícia Simões (BA) e Beth Formaggini (RJ), bem como Marcelo Pedroso (PE) e Emílio Domingos (RJ), exibem seus trabalhos em sessões de cinema online, com bate-papos virtuais. Nos dias seguintes exibem outras obras em cursos gratuitos sobre diversas vertentes do cinema do real. Já a pesquisadora Carla Damião (SP), professora da Universidade Federal de Goiás - com pós-doutorado pela Universidade de Amsterdã, propõe uma investigação sobre as Narrativas de si no Cinema.
A 3a REAU traz como novidade a sessão Cinema Essencial, dedicada a obras seminais da cinematografia brasileira contemporânea, títulos que de alguma forma propuseram inovações narrativas e/ou técnicas, que testaram os limites da linguagem cinematográfica e lograram mudar o cenário audiovisual nacional, servindo mesmo como modelo para produções que as sucederam: obras que inauguraram movimentos ou “fizeram escola”. O filme escolhido para inaugurar a sessão Cinema Essencial foi Pacific, que será revisitado e novamente debatido 11 anos após seu lançamento.
Além dos cursos e sessões comentadas, a 3a edição da REAU traz duas mostras: Memória para Uso Diário - O Cinema de Beth Formaggini, com sete títulos, entre longas, médias e um curta-metragem; e a mostra REAU Acessível, com filmes com audiodescrição e tradução em língua brasileira de sinais - Libras, pensada como uma maneira de ampliar ainda mais o intercâmbio da rodada com a comunidade goiana.
Seja em busca de entendimento, de encontro e troca, ou mesmo como uma reação possível à(s) realidade(s), a rodada deseja a participação de todas as pessoas que pensam "com" e "sobre" sons e imagens.
O ROTEIRO NO DOCUMENTÁRIO, com Letícia Smões (BA)
De 24 a 28 de Agosto, das 19h às 22h (com exceção da sexta-feira: 19h às 21h)
O módulo 1 tem início com as exibições online dos longas O Chalé é Uma Ilha Batida de Vento e Chuva (seleção oficial Cinélatino Toulouse 2018, França; Prêmio Olhares Brasil de melhor longametragem e Prêmio Looke de Distribuição, ambos do 7° Olhar de Cinema) e Casa (Prêmio Olhares Brasil de melhor longa e Prêmio Looke de distribuição, ambos do 8° Olhar de Cinema).
Também de maneira virtual, o curso será aberto com uma conversa com a diretora/ roteirista baiana Letícia Simões, mediada pelo realizador, pesquisador e professor de cinema e audiovisual (UEG), Rafael de Almeida, e pela nossa curadora Uliana Duarte.
Na sequência, Letícia faz uma pequena apresentação do panorama do documentário no cinema contemporâneo e, especialmente, do documentário brasileiro, seguida de um passeio pelas principais “classificações” do gênero. Aborda a escrita do roteiro como estratégia para se compreender o que se quer; as questões específicas de um projeto de documentário; métodos de pesquisa; fundos para documentários: roteiro para projetos; o roteiro do documentário antes, durante e depois da filmagem.
A posição do roteirista diante do material. Organização, proposta de estrutura, diferentes escaletas. A escrita do OFF para o narrador durante a montagem. Como é escrever para outra pessoa? Métodos e ética.
Análise dos projetos/ roteiros de O Chalé é uma Ilha Batida de Vento e Chuva (aprovado pelo MINC) e Tudo Vai Ficar da Cor que Você Quiser (aprovado pela SeCult-RJ), de Letícia Simões, além de Construindo Pontes (aprovado pelo PRODECINE-05) e Somos o que Perdemos (aprovado pelo PRODAV-01), ambos dirigidos por Heloísa Passos e escritos por Letícia Simões e Heloísa Passos, entre outros.
A PRÁTICA NO DOCUMENTÁRIO – O PROCESSO DE FILMAGEM DA TRILOGIA DO CORPO, com Emilio Domingos (RJ)
De 31 de agosto a 04 de setembro, das 19h às 22h (com exceção da sexta-feira: 19h às 21h)
Emílio Domingos abre o módulo 2 com um bate-papo sobre seus filmes Favela é Moda (2020), Deixa na Régua (2016) e A Batalha do Passinho (2013) - exibidos online, com o professor Rafael de Almeida e a pesquisadora Uliana Duarte. Na sequência do curso, faz um exame detalhado sobre sua produção cinematográfica, delineando técnica e formalmente o processo de realização dos três longas que compõem a Trilogia do Corpo.
Depois dos premiados A Batalha do Passinho e Deixa na Régua, em seu novo filme, Favela é Moda, o documentarista aborda o surgimento de agências de modelos nos morros cariocas e a representação do negro no mercado da moda. Esses documentários, que têm como personagens moradores de comunidades carentes, tratam do cotidiano dos jovens de favelas e periferias por meio de suas expressões corporais. O corpo como mediador social, responsável por dinheiro, fracasso, status, desprezo, etc – o movimento, a estética e a identidade.
Domingos abordará o cinema documentário como forma de dar visibilidade a temas periféricos, permitindo o diálogo entre espectador e personagem, aproximando universos que dificilmente fariam contato por outras vias. Registrar é dar o valor, o status devido. O documentário como instrumento de representatividade, contar histórias do povo simples e fazer o cinema contemplar essa realidade sem negá-la.
A IMAGEM EM REGIME ADVERSATIVO, com Marcelo Pedroso
De 14 a 18 de setembro, das 19h às 22h (com exceção da sexta-feira: 19h às 21h)
O realizador pernambucano Marcelo Pedroso abre o módulo 4 com o pré-lançamento do longa Por Trás da Linha de Escudos, polêmico documentário sobre a tropa de choque da PM que, após gerar controvérsia em sessão no Festival de Brasília 2017, foi recolhido pelo diretor; ainda na abertura, também será exibido o longa Pacific, clássico título lançado em 2009, na sessão Cinema Essencial. Nos dois primeiros dias de curso, seguem conversas sobre os filmes com Marcelo Pedroso, mediadas pelos pesquisadores Rafael de Almeida (UEG) e Uliana Duarte (nonanuvem filmes). Na sequência, o cineasta enfoca o tipo particular de documentário em que o diretor se coloca em situação de conflito com relação às pessoas que filma. A discussão partirá de um dos principais autores que trataram da questão, o francês Jean-Louis Comolli, através do artigo “Mon ennemi préféré?”, posteriormente reescrito e publicado no Brasil em 2008 com o nome de “Como filmar o inimigo?”.
Assim, serão abordados os aspectos estéticos e políticos, a exemplo daqueles com os quais o autor se deparou ao filmar, em diferentes ocasiões, militantes do Front National (FN), partido francês de extrema direita e orientação xenófoba, frente ao qual o autor-documentarista guarda divergências. As reflexões estruturadas no decorrer do módulo 4 partem dos textos de Comolli, mas se fundam também na experiência pessoal de Marcelo Pedroso como realizador documentarista que se dispõe também a registrar o “inimigo”, a tropa de choque da polícia militar, o braço armado do estado incumbido de debelar protestos populares. E é no diálogo com o texto de Comolli que Pedroso circunscreve o horizonte contido nas conjecturas apresentadas em sua tese de doutoramento e no artigo "Três suposições sobre a adversidade no documentário" (DEVIRES, BELO HORIZONTE, V. 10, N. 2, P. 24-41, JUL/DEZ 2013). Embora recorra a exemplos para ilustrar algumas situações, a formulação de tais suposições está ligada a uma tentativa de delimitar pontos que se apliquem a uma observação geral dos documentários em que o conflito ou a divergência são cultivados como elementos impulsionadores do fazer-filme.
AS LINGUAGENS NO DOCUMENTÁRIO, com com Beth Formaggini (RJ)
De 21 a 29 de setembro, das 19h às 21h (com pausa no fim de semana)
A realizadora carioca Beth Formaggini participou de alguns dos mais importantes filmes documentais do cinema brasileiro e, ancorada em sua ampla experiência, conduz o módulo 5 tratando de questões éticas e estéticas no documentário e suas diversas linguagens. Beth, que é historiadora pela pela Universidade Federal Fluminense e especialista em documentário e pesquisa audiovisual pela Universidade de Roma (Itália), discute também a escolha do assunto a ser tratado, a delimitação do objeto no tempo e no espaço. Aborda os múltiplos formatos possíveis de filmes de arquivo, identificando suas fontes de pesquisa de texto, imagens, locação e personagens.
Após exibição de parte significativa de sua premiada filmografia durante o fim de semana anterior ao início do curso, na mostra online Memória para Uso Diário - o Cinema de Beth Formaggini (Nobreza Popular, Memória para Uso Diário, Xingu Cariri Caruaru Carioca, Coutinho.doc - Apartamento 608, Pastor Cláudio e Angeli 24 horas), o primeiro encontro com a cineasta carioca será reservado para uma conversa sobre seu último longa, Pastor Cláudio, intermediada pelos também realizadores Rafael de Almeida - professor de cinema e audiovisual da Universidade Estadual de Goiás, e Uliana Duarte - doutoranda em cultura visual pela Universidade Federal de Goiás.
NARRATIVAS DE SI NO CINEMA: O Olho Prismático da Memória, com Carla Damião (SP-GO)
O módulo trata de um tema vastamente explorado na literatura e no cinema. O conhecimento de si, no entanto, é um tema que se encontra, de maneira mais ampla, nas origens do pensamento e de sua expressão oral ou escrita. Quantas vezes aqueles que oferecem cursos de cinema, no exercício dos primeiros roteiros, não se deparam com roteiros semelhantes, cujo personagem é único... a história de si mesmo, o espelho criado sem reflexo imediato, como um prisma que se alarga da escrita inicial à incorporação de cenas, espaços, personagens, figurinos, cenários e ação. Da parte estreita à abertura do prisma, percebemos uma densidade inédita no cinema, que o torna uma narrativa de si abrangente em conexões e detalhes, fornecendo mecanismos inéditos à procura e apresentação da memória. A confecção dessa história é viva e complexa, independente de quem a escreve isoladamente. Esse curso pretende tratar a complexidade do tema de maneira aplicada, isto é, com base na escolha e exibição de trechos de filmes considerados nesse gênero. Entre os quais: Fanny e Alexander (1982) de Bergman; Sonho de valsa (1986) de Ana Carolina; Autobiography of a Man Who Carried His Memory in His Eyes (2000) e As I Was Moving Ahead Occasionally I Saw Brief Glimpses of Beauty (2001) de Jonas Mekas; As Praias de Agnès (2008) de Agnès Varda; Poesia sem fim (2016) de Alejandro Jodorowsky; David Lynch: A Vida de um Artista (2016) de David Lynch; No intenso agora (2017) de João Moreira Salles; Roma (2018) de Alfonso Cuaron; entre outros exemplos.